O futebol, assim como a música, cinema e outras paixões, o elo da minha memória. Não dá para explicar racionalmente o que me faz linkar os fatos da história com elas e me ajudam a recuperar o passado. Quem vai me entender se eu falar que o lançamento álbum da Blitz tem a ver com a coleção de bola de gude que comecei a fazer, por exemplo. Não dá mesmo. Costumo ouvir dizer que tenho memória de elefante, mas o que me faz deixar a história viva no tempo são pequenos detalhes.
Como criança apaixonada por futebol, torci pelo Sport por influência dos tios. Meu pai nem ligava para o esporte, embora gostasse de assistir às raras partidas transmitidas pela TV. Toda aquela paixão me criou o exercício de buscar histórias. Elas ficaram cravadas no subconsciente, mesmo sem elas terem tanta importância para o coletivo. Imagina aquelas que mexem com a sociedade e deixam a gente de cabelo em pé.
Pois bem, no dia 13 de maio de 1984, eu fui pela primeira vez na Ilha do Retiro. O jogo era Sport x São Paulo, válido pela Taça Heleno Nunes. Antes, eu ia a poucos jogos. Tinha apenas 10 anos e dependia do meu pai para que me levasse. Como o estádio ficou um bom tempo de portas fechadas por conta das obras, o Sport mandava no Arruda, num tempo em que briga de torcida era coisa rara. Ver o Leão na Ilha do Retiro era um sonho para um garoto apaixonado por futebol e pelo time queria realizar. E entre eles, eu.
Durante o mês de maio só se falava na reabertura da Ilha do Retiro e eu enchi o saco do meu pai para me levar. As matérias dos jornais já falavam da ampliação do estádio, da modernidade, do jogo contra o São Paulo e do desfile de um leão pela Ilha, antes da bola começar a rolar. Oi, um Leão? Sim, uma fera seria a atração. E eu pensando que tudo era de brincadeira. Santa inocência.
Chegar na Ilha do Retiro foi novela. Peguei o ônibus com meu pai, Marcos, e meu amigo Zezé. Descemos em Afogados e iriamos a pé. Até que Célio, um outro amigo, oferece uma carona no Opala Roxo. O carro já estava lotado. Mas a gente se espremeu. Lá vamos nós. Célio estacionou o carro na lateral da Ilha, naquela rua que tem um canal e dá no prédio do Sebrae.
Entramos no estádio e já estava lotado. Fiquei no pé do alambrado da arquibancada central. Com apenas 10 anos, não dava para ver o jogo. Meu pai seguia reclamando porque havia deixado de ver Corinthians x Fluminense, válido pela semifinal do Brasileiro, que a Globo transmitiria. Ele queria ficar no conforto do lar e ver um bom jogo. Começa a chover. Meu pai , para tentar me proteger, pega um saco de cimento rasgado que estava no chão. Ranço da obra. Ainda havia “migalhas de areia”, que preencheu sua cabeça praticamente careca. A reclamação aumentou.
Começa a festa com garotas entrando em campo, com bolas na mão, mascotes também estão em campo. E de repente, o leão enjaulado. Não tinha como não ficar perplexo. Olhos arregalados, fiquei impressionado. O animal circulou toda a Ilha do Retiro. Que festa espetacular. O time do Sport não tinha lá essa qualidade de empolgar a torcida. Mas eu estava ali para ver o time ganhar, não importa se era ruim ou bom. O 0x0 contra o São Paulo foi frustrante. Quem já viu ir para o estádio e a rede não balançar. Especialmente numa festa daquela. O árbitro deveria até marca pênalti para isso acontecer.
Mas o tempo me ajuda a desvendar que o valeu mesmo foi estar num momento histórico do futebol pernambucano e no clube que me fez alimentar ainda mais minha paixão pelo esporte. Aquele garoto jamais imaginava que seria cronista esportivo. Mas aquele momento ficou arquivado na memória. Escrevi para o site oficial do Leão essa história. Com mais riqueza de detalhes para explicar de onde veio o mascote vivo e o seu nome: Príncipe Charles.
A repórter Camila Souza, do GE, me ligou e rindo de tudo que leu, me falou que iria desenvolver mais a história. E assim fez. A matéria veiculada o portal e no Globo Esportes eterniza tudo e compartilha para a nova geração o valor da história, do passado e do quanto o futebol é capaz de mudar um sociedade.
Que o futebol seja eterno!!!