De todas as histórias contadas sobre Pelé, a que mais me impressiona é a que acontece antes do seu inicio de carreira: ao ver seu pai chorar porque o Brasil perder para o Uruguai, em pleno Maracanã, por 2×1, de virada, o que seria o primeiro título mundial, o garoto Edson pegou ele, deu um abraço e disse: “Não fica assim, Pai… Eu vou dar uma Copa do Mundo para você!”. Afago, premonição, sonho, loucura… Um misto de tudo.
Acelera o tempo e uma imagem que também me marca muito tem a ver com a cena descrita acima. Após vencer a Suécia, por 5×2, o capitão Bellini levanta a taça. O Brasil, enfim, conquista o título, mostra sua força. E o menino Edson, de apenas 17 anos, chora compulsivamente. Os experientes Didi e Gilmar o acalmam. Ali, nascia Pelé para o mundo. E com certeza, além da descarga de emoção pelos dois gols marcados, a conquista do título para uma nação, também estava a promessa cumprida ao pai.
Pelé tinha a camisa 10 nas costas por acaso. Era reserva e organização do Mundial distribuiu a numeração das camisas de forma aleatória, seguindo a ordem da lista de inscrição dos atletas. O menino jogou tanto que a 10 ficou para ele e transformou o número numa mística de grande craque quem a vestia. Impressionante, não?! Durante todo esse tempo, eu fico sempre imaginando Pelé um herói de super poderes que consegue transformar o mundo, bastava sonhar, acreditar e ir em busca do que é seu. Pelé sabia disso. E com o tempo, o Mundo passou a saber. Se eu tinha admiração por seu futebol e pelo fato de Pelé ser reverenciado por todo mundo durante toda história, a sua morte é a comprovação da sua genialidade, que vira eternidade no momento em que deixa esse universo.
E assim, Pelé foi jogando seu futebol maravilhoso. Jogadas antológicas, gols espetaculares. O futebol brasileiro passou a ter uma linha do tempo: Antes de Pelé (AP) e Depois de Pelé (DP). Tornou o futebol arte. Pop. Tanto que até o pai da Pop-art, Andy Warhol o fotografou. Enquanto entortava os adversários, estufava as redes, levantava a taça, o Mundo o reverenciava. Em visita oficial ao Brasil, em 1968, a Rainha Elizabeth II, da Inglaterra, entregou a taça de campeão a Pelé.
Em uma partida organizada em prol da luta ao câncer, em 1971, em Paris, Pelé apresentou a atriz francesa Brigitte Bardot aos seus colegas do Santos. No Brasil, o Rei gravou música com a Elis Regina, “Perdão Não Tem” e “Vexamão”. Tiverem encontros com presidentes. Pelé também tem disco gravado com Sérgio Mendes, um brasileiro respeitadíssimo no circuito mundial da música, Meu Mundo é uma bola, de 1977.
De passagem pelo Brasil em novembro de 1965, o então senador democrata por Nova York Robert Kennedy foi ao vestiário do Maracanã se encontrar encontrar com Pelé, após um jogo do Santos. Em 1975, ensinou ao então presidente norte-americano, Gerald Ford, a fazer embaixadinhas. Em 1986, foi recebido pelo ex-cowboy e presidente dos EUA, Ronald Regan, na Casa Branca. Anos antes, o encontro mais polêmico: às vésperas do Mundial do México, em 1970, posou para foto a o lado de Emílio Garrastazu Médici, presidente do Brasil ditadura.
Em 1977, quando se despediu do futebol, jogando pelo Cosmos, Muhammad Ali fez questão de estar presente para abraça-lo. Recebe de volta um beijo na face. Foi nesse mesmo dia em que, falar para o público, Pelé pediu “Love, Love, Love”. E Caetano Veloso tornou música, gravada no disco Muito – Dentro da Estrela azulada, de 1978.
Em 1981, Pelé estava nas telonas. O craque estrelava, ao lado de Silvester Stallone e Michael Caine, o filme Fuga para a Vitória, em 1981. É no cinema que Pelé fez uma das cenas mais hilárias que já vi cinema nacional. Em 1979, o Rei estrelou o filme Os Trombadinhas, de Anselmo Duarte. Numa das cenas, ele intercepta Arlete, personagem da atriz Ana Nascimento Silva, que o questiona se ele é realmente o Pelé. E o Rei dispara: “Não, sou o Jô Soares, sua piranha”.
Amantes do futebol da minha geração não viu Pelé em ação para valer. Uma pena. O meu, ou melhor, nosso consolo foi um amistoso no dia 31 de outubro de 1990, na Itália. A seleção brasileira comandada pelo técnico Paulo Roberto Falcão enfrentou o combinado do Resto do Mundo. A seleção brasileira jogou com a seguinte formação: Sérgio, Gil Baiano, Paulão, Adilson e Leonardo, César Sampaio, Donizete Oliveira, Cafú e Pelé; Charles e Rinaldo. O Rei jogou 42 minutos e foi substituído por Neto. Mas antes de sair de cena, poderia ter recebido uma bola para finalização, se não fosse o atacante Rinaldo, o Ratoeira, ex-Santa Cruz e Sport, que atrapalhou a jogada.
Pois é…. O garotinho que fez promessa a seu pai fez bem mais do que prometeu. Encheu o coração do seu pai e do mundo de orgulho pelo o que fez pelo futebol. Fé, perseverança, dom, sorte, amor, luta, talento, foco… Não importa quais elementos e sentimentos mais usou. Pelé será um heroi de toda uma geração. Um ser respeitado por todos. E, por isso, eterno.
Viva, Pelé!