O ano era de 2002. O então goleiro do Santa Cruz, Nilson, estava indignado. O encontrei no aeroporto dos Guararapes. O time coral embarcaria para alguma capital do Brasil para uma partida da Série B. Sua revolta era por conta da partida anterior, quando havia sido vítima de racismo pela torcida do Náutico. Os alvirrubros haviam feito ruídos de macaco cada vez que o goleiro pegava na bola.
Lembro demais da sua declaração indignação: “Não quero saber. Vou fazer alguma coisa, tomar providências. Acionar a justiça contra o clube ou contra os torcedores. Não sei. Vou estudar direitinho. Só não pode ficar assim”.
Eu e os demais companheiros de imprensa ficamos nos questionando… “Nilson vai lutar em vão. Como é que ele vai conseguir punir algo que o clube não tem culpa? E vai focar a punição em quem, já que muitos torcedores faziam o mesmo ato?” Era o típico do pensamento de quem achava tudo natural. E mais: era Nílson sozinho contra as circunstâncias. Tristes circunstâncias.
Ainda bem que o tempo passou. O olhar está mudando. E o grito solitário de Nilson, no início da década passada, ecoa. Graças a Deus. Nos últimos anos, vários casos de racismo aconteceram e muitos atletas mostraram sua indignação. Mas, o que aconteceu na terça-feira, dia 8 de dezembro, foi histórico. E pode representar uma ruptura mais incisiva.
Os jogadores de Paris Saint-Germain (França) e Istambul Basaksehir (Turquia) abandonaram o campo durante o primeiro tempo da partida válida pela última rodada da fase de grupos da Champions League, por um motivo justo: o auxiliar-técnico do Basaksehir, o camaronês Pierre Webó, acusou o quarto árbitro do jogo, o romeno Sebastian Coltescu, de ofendê-lo com a expressão racista “Aquele preto ali”.
A atitude dos jogadores foi linda. Tem que agir assim mesmo. Mostrar que não se faz sentido existir racismo. Nunca fez. E agora, mais ainda. Foi fundamental também o fato das estrelas Neymar e Mbappé no episódio. ” “Nós não vamos jogar”, afirmou Neymar. “Se esse cara não sair, nós não jogamos”, disseram. Sensacional.
É aquele episódio lamentável. Mas que acredito que, pela postura dos jogadores, vamos mudar essa história. Abolir de vez o racismo no esporte.
Em tempo:
Todos sabem que Nilson jogou no Náutico em 2004 e 2005, sendo campeão pernambucano e ídolo. E, recentemente, foi protagonista da campanha que o clube fez para o lançamento da camisa preta, um fato histórico no Timba.